sábado, 15 de novembro de 2008

ANA TEBEROSKY

''Debater e opinar estimulam a leitura e a escrita''

Para a educadora argentina, nas sociedades em que se valoriza a interação entre as pessoas e a cultura escrita, o processo de alfabetização é mais eficiente
Paola Gentile

Ana Teberosky é uma das pesquisadoras mais respeitadas quando o tema é alfabetização. A Psicogênese da Língua Escrita, estudo desenvolvido por ela e por Emilia Ferreiro no final dos anos 1970, trouxe novos elementos para esclarecer o processo vivido pelo aluno que está aprendendo a ler e a escrever. A pesquisa tirou a alfabetização do âmbito exclusivo da pedagogia e a levou para a psicologia. "Mostramos que a aquisição das habilidades de leitura e escrita depende muito menos dos métodos utilizados do que da relação que a criança tem desde pequena com a cultura escrita", afirma. Para ela, os recursos tecnológicos da informática estão proporcionando novos aprendizados para quem inicia a escolarização, mas as práticas sociais, cada vez mais individualistas, não ajudam a formar uma comunidade alfabetizadora.
Doutora em psicologia e docente do Departamento de Psicologia Evolutiva e da Educação da Universidade de Barcelona, ela também atua no Instituto Municipal de Educação dessa cidade, desenvolvendo trabalhos em escolas públicas. Em setembro, quando esteve no Brasil para participar do Congresso Saber 2005, ela deu a seguinte entrevista à ESCOLA.

Os defensores do método fônico culpam o construtivismo, base dos Parâmetros
Curriculares Nacionais, pelos problemas de alfabetização no Brasil. O que a senhora pensa disso?
Ana Teberosky - Para afirmar se a culpa é ou não de determinada maneira de ensinar, seria necessário ter um estudo aprofundado das práticas pedagógicas dos alfabetizadores em todo o país. Uma coisa é o que eles declaram fazer, outra é o que eles executam de fato. Quem afirma que uma forma de alfabetizar é melhor que a outra está apenas dando sua opinião pessoal já que não existe nenhuma pesquisa nessa linha. A dificuldade em alfabetizar no Brasil é histórica e já existia mesmo quando o método fônico estava na moda.

O bom desempenho de alguns países nas avaliações internacionais pode ser atribuído à utilização do método fônico?
Ana Teberosky -Não dá para comparar um país com outro, porque não é somente a maneira de ensinar que muda. Outros fatores aliás, importantíssimos influenciam no processo de aquisição da escrita, como as características de cada idioma. É muito mais fácil alfabetizar em uma língua em que há correspondência entre o sistema gráfico e o sonoro ou naquelas em que as construções sintáticas são simples, por exemplo.

O método fônico e a psicogênese da língua escrita são incompatíveis?
Ana Teberosky - A psicogênese não é método, e sim uma teoria que explica o processo de aprendizagem da língua escrita. Nesse contexto, defendemos a integração de várias práticas pedagógicas. Mas o importante é que se leve em conta, além do código específico da escrita, a cultura e o ambiente letrados em que a criança se encontra antes e durante a alfabetização. Não dá para ela adquirir primeiro o código da língua e depois partir para a compreensão de variados textos. Nós acreditamos que ambos têm de ocorrer ao mesmo tempo, e aí está o diferencial da nossa proposta.

Como o processo de alfabetização deve ser avaliado?
Ana Teberosky - O professor deve se basear no momento inicial de aprendizagem de cada aluno, verificando o que ele conquistou em determinado período. Além do mais, a avaliação passa pela análise do próprio trabalho: o professor tem condições materiais e estruturais para ensinar? Ele criou um ambiente alfabetizador favorável à aprendizagem e necessidades de usar a língua escrita?

O que é um ambiente alfabetizador?
Ana Teberosky - É aquele em que há uma cultura letrada, com livros, textos digitais ou em papel , um mundo de escritos que circulam socialmente. A comunidade que usa a todo momento esses escritos, que faz circular as idéias que eles contêm, é chamada alfabetizadora.


Quais atividades o professor alfabetizador deve realizar?
Ana Teberosky - Formar grupos menores para as crianças terem mais oportunidade de falar e ler para elas são estratégias fundamentais! É preciso compartilhar com a turma as características dos personagens, comentar e fazer com que todos falem sobre a história, pedir aos pequenos para recordar o enredo, elaborar questões e deixar que eles exponham as dúvidas. Se nos 200 dias letivos o professor das primeiras séries trabalhar um livro por semana, a classe terá tido contato com 35 ou 40 obras ao final de um ano.

É correto o professor escrever para os alunos quando eles ainda não estão alfabetizados?
Ana Teberosky - Sim. A atuação do escriba é um ponto bastante importante no processo de alfabetização. O estudante que dita para o professor já ouviu ou leu o texto, memorizou as principais informações que ele contém e com isso consegue elaborar uma linha de raciocínio. Ao ver o que disse escrito no quadro-negro, ele diferencia a linguagem escrita da falada, seleciona as melhores palavras e expressões, percebe a organização da escrita em linhas, a separação das palavras, o uso de outros símbolos, como os de pontuação. A criança vê o seu texto se concretizar.

O computador pode ajudar na alfabetização?
Ana Teberosky - O micro permite aprendizados interessantes. No teclado, por exemplo, estão todas as letras e símbolos que a língua oferece. Quando se ensina letra por letra, a criança acha que o alfabeto é infinito, porque aprende uma de cada vez. Com o teclado, ela tem noção de que as letras são poucas e finitas. Nas teclas elas são maiúsculas e, no monitor, minúsculas, o que obriga a realização de uma correspondência. Além disso, quando está no computador o estudante escreve com as duas mãos. Os recursos tecnológicos, no entanto, não substituem o texto manuscrito durante o processo de alfabetização, mas com certeza o complementam. Aqueles que acessam a internet lêem instruções ou notícias, escrevem e-mails e usam os mecanismos de busca. Ainda não sabemos quais serão as conseqüências cognitivas do uso do computador, mas com certeza ele exige muito da escrita e da leitura.

É possível alfabetizar em classes numerosas?
Ana Teberosky - Depende da quantidade de alunos. Em quatro horas de aula por dia com 40 crianças, é muito difícil e eu não saberia como fazer... Seria melhor se cada sala tivesse 20, 25. Em Barcelona, estamos experimentando os agrupamentos flexíveis, que misturam grupos de diferentes níveis, com 12 estudantes e com três ou quatro professores à disposição para orientação. Existem algumas possibilidades desde que haja contribuição da gestão pública.

3 comentários:

  1. Olá Susana!
    Sou formadora do antigo LETRA E VIDA hoje LER E VIVER, se precisar tenho bastante material.
    Com carinho
    Silvana Marmo

    ResponderEliminar
  2. Oi amiga Flor,Blog interessantíssimo,já decolou.Mais um ano se passou e, ao rever a nossa árvore... foram momentos lindos, deixaram saudades. Muito
    oportuno o texto de hoje do Linhaça, deixo aqui o final dele, é sua imagem e semelhança.
    Meus parabéns a todos os educadores que buscam novos caminhos, fugindo da mesmice que impede o crescimento.
    São exemplos simples como este que demonstram que não é preciso ter grandes recursos financeiros para se fazer a diferença na vida das pessoas, basta um pouco de boa vontade e o desejo de querer olhar além do próprio umbigo.

    Bjs...

    ResponderEliminar
  3. Olá, gostei das perguntas e repostas deste texto, e o mais interessante é que todos concordam com um numero menor de aluno em sala de alfabetização, mas na verdade estamos sempre com alunos saindo pelo vitrô. Isso me deixa apavorada e desanimada. Será que um dia vamos poder trabalhar com mais tranquilidade. Queira Deus.

    ResponderEliminar